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COVID-19: reinfecção ou a reativação do SARS-CoV-2? por Mauren Isfer Anghebem

A infecção pelo SARS-CoV-2 induz imunidade duradoura? O paciente pode se reinfectar? Pode ocorrer uma reativação do vírus após um período de latência? Perguntas para as quais as respostas estão sendo elaboradas ao passo que dados científicos robustos se apresentam.

Quase um ano após os primeiros casos da COVID-19 ainda não há consenso na literatura sobre diversos aspectos da doença, embora fortes evidências têm demonstrado que a reinfecção por SARS-CoV-2 é um evento provável e já está acontecendo ao redor do mundo.

China (1,2), Itália (3), Coreia do Sul (4), Paquistão (5), Suíça (6), Turquia (7), Qatar (8), Estados Unidos (9) França e Espanha (10), Holanda (11), Equador (12) e diversas regiões do Brasil (13–16) reportaram casos de pacientes diagnosticados com COVID-19
(clínica e laboratorialmente) que voltaram a apresentar resultados de RT-PCR positivos e manifestação clínica de COVID-19 semanas ou meses após a remissão clínica da primeira infecção e da alta hospitalar baseada em dois resultados negativos por RT-PCR.

A reinfecção humana por SARS-CoV-2 foi comprovada pela primeira vez em agosto de 2020 em Hong Kong, por meio do sequenciamento genético de duas amostras coletadas por swab de nasofaringe do mesmo paciente, com intervalo de 142 dias. O
genoma viral das duas amostras pertenciam a linhagens diferentes, o que comprova a hipótese de reinfecção. (1) Depois deste, outros pesquisadores evidenciaram casos de pacientes infectados pelo SARS-CoV-2 em duas ocasiões diferentes, por vírus geneticamente distintos. (9,11,12)

No dia 10 de dezembro de 2020, o Ministério da Saúde confirmou o primeiro caso de reinfecção por SARS-CoV-2 no Brasil. O caso é de uma médica de 37 anos, que reside em Natal, Rio Grande do Norte. Ela teve a doença em junho, e teve resultado positivo
novamente 116 dias depois do primeiro diagnóstico. O caso de reinfecção foi confirmado pela Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) por sequenciamento genético, que provou se tratar de dois genomas virais diferentes na primeira e segunda infecção. Conforme critérios estabelecidos na Nota Técnica Nº 52/2020-CGPNI/DEIDT/SVS/MS, esses resultados laboratoriais permitem confirmar o primeiro caso de reinfecção no Brasil.

A possibilidade de recidiva ou reativação viral também tem sido investigada. Uma das explicações para a reativação viral reside no fato de que o SARS-CoV-2 utiliza endossomos como via de transporte celular, com liberação de exossomos e vesículas extracelulares carregados de vírus, o que pode explicar o reaparecimento de RNA viral mesmo depois de 14 dias da alta hospitalar de pacientes recuperados da COVID-19. (17) Além do transporte intracelular e da liberação viral prolongada, outra possibilidade para a reativação viral seria uma resposta imunológica retardada do hospedeiro. (8)

Fatores imunossupressores, como drogas ou condições patológicas, podem prejudicar a depuração viral e favorecer a reativação do SARS-CoV-2. (18) A terapia imunossupressora parece induzir a reativação do SARS-CoV-2, uma vez que há relatos de pacientes recuperados da COVID-19 que voltaram a apresentar quadro clínico e resultado de swab de nasofaringe positivo por RT-PCR após sessões de quimioterapia. (19,20)

É sabido que reinfecções virais ocorrem quando a imunidade celular e/ou humoral é insuficiente ou de curta duração. Para se preparar para futuras ondas de COVID-19, é importante elucidar a duração da proteção contra a reinfecção. Uma questão que tem preocupado a comunidade científica é a possibilidade das infecções assintomáticas não fornecer imunidade protetora de longo prazo para todos os
pacientes, o que poderia torná-los suscetíveis a reinfecções pelo SARS-CoV-2. (8) No que se refere à resposta imune e resultados sorológicos, ainda é incerto se indivíduos com anticorpos IgG estão protegidos contra uma reinfecção por SARS-CoV-2 e, se for o caso,
qual concentração de anticorpos seria capaz de conferir proteção e por quanto tempo estariam protegidos. (21)

Edridge e colaboradores (2020) hipotetizaram que as características compartilhadas pelos quatro coronavírus sazonais (HCoV-NL63, HCoV-229E, HCoV-OC43 e HCoV-HKU1), como a duração da imunidade protetora, poderiam ser estendidas para todos os coronavírus humanos, incluindo o SARS-CoV-2. Embora os anticorpos sejam apenas um dos marcadores de imunidade da COVID-19 (também influenciada por células B e T), os autores sugerem que as concentrações de anticorpos contra o SARSCoV-2 diminuem 2 meses após a infecção, especialmente nos casos de COVID-19 leve. E que as reinfecções ocorrem com mais frequência 12 meses após a infecção, indicando que a imunidade protetora é de curta duração. (22)

Como dito, uma forte evidência de reinfecção é a identificação de uma nova infecção por uma linhagem de SARS-CoV-2 que seja geneticamente distinta daquela que causou a primeira infecção. O estudo genômico do SARS-CoV-2 através do sequenciamento do vírus é a ferramenta essencial para a diferenciação entre reinfecção e recidiva/reativação; todavia, não está disponível na maioria dos serviços de saúde.

Frente aos crescentes relatos de reinfecção ou reativação do SARS-CoV-2, não é possível afirmar que pessoas diagnosticadas com COVID-19 estão imunes à reinfecção e nem por quanto tempo estão protegidas. Considerando isso, o uso de máscaras, medidas de higiene e distanciamento social, além do isolamento dos pacientes com resultado positivo para o COVID-19, ainda são condutas vitais.

Referências:

1. To KK-W, Hung IF-N, Ip JD, Chu AW-H, Chan W-M, Tam AR, et al. COVID-19 re-infection by a
phylogenetically distinct SARS-coronavirus-2 strain confirmed by whole genome sequencing. Clin
Infect Dis. 2020;ciaa1275.
2. Ye G, Pan Z, Pan Y, Deng Q, Chen L, Li J, et al. Clinical characteristics of severe acute respiratory
syndrome coronavirus 2 reactivation. J Infect. 2020;80(5):e14–7.
3. Loconsole D, Passerini F, Palmieri VO, Centrone F, Sallustio A, Pugliese S, et al. Recurrence of
COVID-19 after recovery: a case report from Italy. Infection. 2020;48(6):965–7.
4. Lee J-S, Kim S, Kim T, Hong K, Ryoo N-R, Lee J, et al. Evidence of Severe Acute Respiratory
Syndrome Coronavirus 2 Reinfection After Recovery from Mild Coronavirus Disease 2019. Clin
Infect Dis. 2020;ciaa1421.
5. Hanif M, Haider MA, Ali MJ, Naz S, Sundas F. Reinfection of COVID-19 in Pakistan: A First Case
Report. Cureus. 2020;12(10):e11176.
6. Ravioli S, Ochsner H, Lindner G. Reactivation of COVID-19 pneumonia: A report of two cases. J
Infect. 2020;81(2):e72-e73.
7. Ozaras R, Ozdogru I, Yilmaz A. Coronavirus disease 2019 re-infection: first report from Turkey.NoTitle. New Microbes New Infect. 2020;38:100774.
8. Sharma R, Sardar S, Mohammad Arshad A, Ata F, Zara S, Munir W. A Patient with Asymptomatic
SARS-CoV-2 Infection Who Presented 86 Days Later with COVID-19 Pneumonia Possibly Due to
Reinfection with SARS-CoV-2. Am J Case Rep. 2020;(21):e927154.
9. Tillett RL, Sevinsky JR, Hartley PD, Kerwin H, Crawford N, Gorzalski A, et al. Genomic evidence for
reinfection with SARS-CoV-2: a case study. Lancet Infect Dis. 2020;S1473-3099(20):30764–7.
10. Lechien JR, Chiesa-Estomba CM, Vaira LA, Saussez S, Hans S. COVID-19 Reinfection and Second
Episodes of Olfactory and Gustatory Dysfunctions: Report of First Cases. Ear, Nose Throat J.
2020;145561320970105.
11. Mulder M, van der Vegt D, Oude Munnink B, Geurts van Kessel C, van de Bovenkamp J, Sikkema R,
et al. Reinfection of SARS-CoV-2 in an immunocompromised patient: a case report. Clin Infect Dis.
2020;ciaa1538.
12. Prado-Vivar B, Becerra-Wong M, Guadalupe J, Marquez S, Gutierrez B, Rojas-Silva P. COVID-19 reinfection by a phylogenetically distinct SARS-CoV-2 variant, first confirmed event in South America.
SSRN. 2020;Online ahead of print.
13. Takeda C, Almeida M, Gomes R, Souza T, Mota M, Cavalcanti L, et al. Case Report: Recurrent
Clinical Symptoms of COVID-19 in Healthcare Professionals: A Series of Cases from Brazil. Am J Trop
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14. Bonifácio L, Pereira A, Araújo D, Balbão V, da Fonseca B, Passos A, et al. Are sars-cov-2 reinfection
and covid-19 recurrence possible? A case report from brazil. Rev Soc Bras Med Trop. 2020;53:e20200619.
15. Torres D, Ribeiro L, Riello A, Horovitz D, Pinto L, Croda J. Reinfection of COVID‐19 after 3 months
with a distinct and more aggressive clinical presentation: case report. J Med Virol. 2020;Online
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16. de Brito CAA, Lima PMA, de Brito MCM, de Oliveira DB. Second episode of COVID-19 in health
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17. Elrashdy F, Aljaddawi AA, Redwan EM, Uversky VN. On the potential role of exosomes in the
COVID-19 reinfection/reactivation opportunity. J Biomol Struct Dyn. 2020;1–12.
18. Gousseff M, Penot P, Gallay L, Batisse D, Benech N, Bouiller K, et al. Clinical recurrences of COVID19 symptoms after recovery: Viral relapse, reinfection or inflammatory rebound? J Infect.
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19. Cysne DN, Fonseca GHH, Gervatauskas KM, Brandão AAGS, Pereira J, Lage LAPC, et al. Reativação
do SARS-CoV-2 após quimioterapia – Relato de Caso. Hematol Transfus Cell Ther. 2020;42:52.
20. Lancman G, Mascarenhas J, Bar-Natan M. Severe COVID-19 virus reactivation following treatment
for B cell acute lymphoblastic leukemia. J Hematol Oncol. 2020;13(1):131.
21. CDC. Centers for Disease Control and Prevention. Interim Clinical Guidance for Management of
Patients with Confirmed Coronavirus Disease (COVID-19). [Internet]. [cited 2020 Dec 8]. Available
from: https://www.cdc.gov/coronavirus/2019-ncov/hcp/clinical-guidance-managementpatients.html
22. Edridge AWD, Kaczorowska J, Hoste ACR, Bakker M, Klein M, Loens K, et al. Seasonal coronavirus protective immunity is short-lasting. Nat Med. 2020;26(11):1691–3.