Um dos mais constantes questionamentos no ambiente laboratorial versa sobre a realização de exames em menores, e se isso pode acontecer quando desacompanhados.
Necessário esclarecer que o Código Civil Brasileiro, no que diz respeito à capacidade para a prática dos atos da vida civil em relação à idade, contempla a seguinte classificação: menores de 16 anos, se absolutamente incapazes, devem ser representados; menores entre 16 e 18 anos, se relativamente incapazes, devem ser assistidos para a prática de certos atos.
Existe uma grande variação da capacidade de compreensão preconizada pelo legislador brasileiro, bem como a necessidade de autocuidados das pessoas com faixa etária de 0 a 18 anos incompletos.
Do ponto de vista legal essas pessoas são consideradas incapazes, existindo uma relatividade entre 16 anos e 18 anos incompletos. Vale dizer que a referida legislação tem maior interesse nas questões da propriedade, mais especificamente na capacidade de decisão em compra e venda de bens, já́ em relação ao corpo e sua saúde cada vez mais se respeita a autonomia relativa aos menores de idade, respeitando o assentimento da criança e do adolescente diante do consentimento dos responsáveis legais.
Se estabelece que os responsáveis legais têm direito a guarda da criança, mas não têm direito de decidir em questões em relação à vida das crianças, quando em risco. É óbvio que sempre as opiniões dos responsáveis legais são colocadas prioritariamente, mas sempre preservando o espírito que norteia o Estatuto da Criança e do Adolescente, ou seja, o dever de proteger o mais vulnerável.
Em algumas vezes os responsáveis legais podem tomar decisões que não são as melhores para as crianças, tendo obrigação, nesse caso, aqueles que tem conhecimento de tais fatos, intervir notificando às autoridades competentes, seja o Conselho Tutelar, ou o Juiz da Infância e da Juventude.
Desta forma, podemos nos referenciar aos posicionamentos que utilizam fundamentos e nos critérios anteriormente descritos em pareceres emitidos pelos Conselhos Regionais de Medicina (CRMs), que têm preconizado que, nos atendimentos médicos a uma criança – portanto, à pessoa com até 12 anos incompletos , é necessário o acompanhamento de um responsável legal, o que inviabiliza qualquer realização de exames laboratoriais quando desacompanhados, bem como a sua retirada pelo menor mesmo que com documentação.
Em se tratando de um adolescente – ou seja, alguém com idade entre 12 e 18 anos –, é possível estar ele desacompanhado, se assim o desejar, sendo-lhe garantidos os direitos da autonomia e do sigilo , com exceção às situações previstas em lei e/ou àquelas que caracterizem risco de morte ao paciente ou a terceiros, entretanto, tendo em vista a questão do código civil, existe a recomendação para que o menor de 16 anos sempre esteja acompanhado por alguém capacitado para a realização do exame, devendo o estabelecimento avalizar quando de sua retirada a razoabilidade do menor retirar o resultado da análise desacompanhado, levando em consideração a gravidade ou complexidade do exame que está sendo realizado.
Salientamos que o Parecer CFM nº 25/13 suscita algumas orientações sobre a questão:
Destaca-se, por fim, em complemento aos apontamentos e orientações até aqui apresentados, que em todos os casos é absolutamente recomendável que esteja presente um acompanhante na sala, quando da realização do exame.
O tema é bem complexo pela quantidade de instrumentos legais a serem analisados, mas meu entendimento e da maioria das consultas que realizei é neste sentido de que uma análise simplista das normas que disciplinam a menoridade poderia conduzir a uma também simplista conclusão de que há impedimento legal incontornável em relação a qualquer manifestação autônoma de menores de 18 anos.
No entanto, o direito há de ser interpretado em conformidade com os princípios que regem as especificidades dos adolescentes abrangidas em cada caso concreto, o que importa considerar e ponderar sobre os fins sociais da norma, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos e a condição peculiar do adolescente como pessoa em desenvolvimento.
Como pessoas em processo de desenvolvimento, os adolescentes têm direito à liberdade, ao respeito e à dignidade, assim como lhes estão assegurados os direitos civis, humanos e sociais tal como garantidos na Constituição, e nas leis, devendo ou podendo então, o laboratório realizar o exame, respeitando sempre a questão fundamental do sigilo e inviolabilidade das informações.