EXAMES OU TESTES?

ENTREVISTA

Dr. Irineu Grinberg
Ex-Presidente da SBAC
Diretor da Lab Farm Consult
irineugrinberg@gmail.com

 

O Laboratório de Análises Clínicas, é o mais prestimoso orientador da Clínica Médica, no fornecimento de confirmações e complementações aos diagnósticos, critérios de remissões de enfermidades ou altas hospitalares.

Entretanto, tem sido acossado e até invadido por diversos entrantes, muitos de origem duvidosa, e ao desamparo das legislações vigentes.
Ao depararmos com anúncios frequentes, produzidos por algumas empresas do comércio farmacêutico, ou até por alguns laboratórios clínicos, fica evidenciado o despreparo, desconhecimento e até desprezo pelas ações e atitudes de qualidade.

São matérias que estiveram em clara evidência na reunião da Diretoria Colegiada da ANVISA, realizada em 22/03/2023. Entre outros importantes itens a serem vistos e apreciados estava o de número 25351.217681/2017-36, cuja pauta discorria a proposta da Diretoria Colegiada que versava sobre os requisitos técnicos sanitários para os Laboratórios de Análises Clínicas e Anatomia Patológica.

 

A revisão do Texto de RDC 302-2005

O relator do processo, Dr. Alex Machado Campos, com a mais absoluta clareza, rejeitou seu texto, por ferir e possibilitar formas inadequadas e não bem resolvidas de “diagnósticos laboratoriais”, bem como as suas realizações em ambientes inadequados, sem relações com Laboratórios de Análises Clínicas ou ambientes hospitalares.

Apreciou também, de forma inequívoca, os trabalhos que nossas entidades profissionais têm produzido para as resoluções dessas não conformidades, com “elegância e profissionalismo”, citando de forma clara e audível as ações e atitudes da SBAC.

As considerações do Dr. Alex foram acompanhadas de forma unânime pelos demais diretores que participaram da análise do texto e votaram no processo.

É de total conhecimento que a RDC 302/2005, ao ser implantada elevou de modo expressivo o nível técnico profissional dos Laboratórios de Análises Clínicas em todo o país, ao adotar e tornar obrigatório alguns itens que sequer eram pensados ou não tidos como importantes àquela época. Qualificou os espaços físicos, voltados a mais conforto e segurança aos clientes, com acessos mais facilitados às suas dependências. Decretou o fim do “pátio”, um espaço, às vezes, quase inacessível, área destinada à coleta de urina ou outros materiais, da mesma forma que agiu em prédios comerciais, nos casos em que existia apenas um sanitário no andar e utilizado por todos, inclusive os que não eram clientes do estabelecimento laboratorial.

Melhorou, de forma sensível a locomoção dos clientes no interior dos laboratórios. O mesmo cuidado foi observado na fiscalização dos equipamentos, para os quais foram exigidas e documentadas revisões periódicas.

E, certamente, o mais importante, tornou obrigatória a participação dos Laboratórios de Análises Clínicas em sistemas externos da verificação da qualidade, com avaliação de desempenho. Àquela época já existiam programas externos e internos de nossas Sociedades científicas, entretanto a adesão nunca foi a aguardada.

A qualidade técnica dos estabelecimentos laboratoriais apresentou um incremento significativo. Desta forma, a participação dos laboratórios cresceu e o acompanhamento laboratorial tornou-se item indispensável e fundamental na avaliação e evolução de quase todas as enfermidades.
Poderia ser definida e classificada a evolução dos sistemas laboratoriais no país, mesmo em lugares distantes, em antes e depois da RDC 302 – 2005.

 

Evidente que, desde àquela época, até 2023 muitas situações modificaram. Novas metodologias diagnósticas requerem outros equipamentos, mais complexos, e dispendiosos. Alguns deles, tem valores muito altos sem condições de serem adquiridos ou utilizados por Laboratórios de pequenos ou médios portes. Porém fundamentais na análise de diversos tipos de enfermidades.

Destacam-se os testes moleculares, que antes do fim desta década, constituirão a maioria dos serviços solicitados e prestados pelo setor laboratorial.
A modalidade de compras unificadas, através de consórcios ou sistemas similares, poderá decretar o fim dessa lacuna, facultando a todos o fornecimento de decisões clínicas, de forma rápida, sem necessidade da remessa de materiais aos centros mais distantes.
As indispensáveis e fundamentais soluções fornecidas pelos Laboratórios de Análises Clínicas, até em situações de distâncias inapropriadas, poderão ser resolvidas desta forma.

A custos técnicos e financeiros mais palatáveis.

É da maior importância a união de todos pequenos e médios laboratórios nas maiorias das cidades ou regiões no sentido de incrementar seus desenvolvimentos técnicos e científicos.

 

E assim, mais vidas a serem salvas.

 

Não podemos mais nos conformar ao enxergar movimentos de colegas caminhando, exatamente no sentido contrário.
A distância é o principal inimigo da qualidade e resolutividade laboratorial. E o atendimento deve ser de qualidade e para todos.
Devemos nos afastar das situações, já documentadas, onde empresas totalmente desconhecidas oferecem a montagem de laboratórios com o slogan:

– “tenha seu próprio laboratório, e deixem os exames por nossa conta”, ou

– “faça seus exames em nosso laboratório. Pague R$ 85.00 por 40 exames, inclui perfil completo de tiroide”, ou

– “farmácias fornecendo formidáveis rol de exames a valores muito baixos, apresentando em seus reclames fotos de equipamentos laboratoriais incompatíveis com suas realidades”.

Verdadeiras pechinchas.

E mais algumas outras situações similares, quase sempre relacionadas à venda e execução de Testes Laboratoriais Portáteis.

Vamos aqui chamá-los apenas de testes rápidos, com quase todos os materiais a analisar mensurados por gotas ou absorção em papel.
Impossível qualificar e denominar esses métodos como laboratoriais. Até porque um dos ítens fundamentais para que um resultado seja incluído no rol dos exatos é a qualificação do volume de material biológico a ser utilizado.

Nos laboratórios essas ações são realizadas por pipetas calibradas ou absorvidos por equipamentos de automação. “Sempre” serão utilizados materiais de controle com concentrações altas e baixas. De modo que, quando todos os resultados das dosagens estiverem prontos, com os controles conferidos, sejam todos liberados, de forma eletrônica.

Assim se faz em Laboratório.

Outra atitude importante e elementar, é trabalhar com materiais centrifugados.
Soro ou Plasma sem interferentes.

Existem farmácias anunciando e realizando um exame chamado de Teste de Anemia. Difícil saber do que se trata. A anemia é diagnosticada pelo hemograma, solicitado pelo médico clínico que examinou o doente. O eritrograma, é a parte do hemograma que analisa a série vermelha. Nos laboratórios de análises clínicas, conscientes de suas atribuições, esse procedimento é realizado por máquinas automatizadas que analisam a série vermelha. Contam também plaquetas, e avaliam a série branca.

São equipamentos dispendiosos e que requerem vigilância extrema e controle de qualidade permanente, em função da sensibilidade e a importância clínica dos dados fornecidos.

Informam, de forma inequívoca o estado do paciente, e seus resultados podem sugerir uma série de enfermidades clínicas, ou prosseguimento de investigações.

Nenhuma tira de papel executa esse trabalho.

Portanto, procedimentos realizados com gotas de materiais biológicos, ou com papéis embebidos em reagentes devem, na mais remota hipótese, ser apelidados apenas de testes.

Jamais substituirão os exames laboratoriais e SEMPRE vão requerer confirmação.