Raissa Mayer Ramalho Catão1, Lenilza Mattos Lima2, Fernanda Matos Leal3
1Diagnose- Clínica de Análises Especializadas – Ltda. Campina Grande-PB, Brasil
2Profa do Departamento de Análises Clínicas da Universidade Federal de Santa Catarina, Brasil
3Médica intensivista do Hospital Unimed Grande Florianópolis e do Hospital Baia Sul, Florianópolis, SC, Brasil
A pneumonia é um problema de saúde pública, de alta incidência, que ocorre durante todo o ano, sendo mais observada nos meses de inverno, onde causa maior morbimortalidade(1). É uma doença amplamente conhecida que pode se apresentar de inúmeras formas dificultando a distinção entre elas. As pneumonias podem ser adquiridas na comunidade (PAC), nos hospitais e ainda existem as conhecidas como síndromes de pneumonias atípicas, que podem ser classificadas baseadas em critérios clínicos, radiológicos e microbiológicos(2).
Um dos maiores desafios na abordagem das pneumonias é a identificação do agente etiológico visto que, durante a coleta, pode ocorrer contaminação da amostra com material do trato respiratório superior que pode estar colonizado por microrganismos patogênicos, porém não causadores de infecções. Em muitos estudos publicados não foi possível identificar a etiologia dos casos de pneumonia, apesar dos diversos recursos de diagnósticos como a sorologia, a pesquisa de antígenos e a detecção de material genético pelo método de reação em cadeia da polimerase (PCR)(3).
Nos casos mais graves da COVID-19, cujo agente etiológico é o SARS-CoV-2, a pneumonia é uma das complicações mais frequentes, podendo estar associada à síndrome respiratória aguda grave(4). A co-infecção com pneumonia bacteriana é um desafio na pandemia, porém estudos tem relatado taxas relativamente baixas, em torno de 7%(5). Para os pacientes internados, principalmente os que cursam com quadro grave e necessitam de internação em Unidades de Terapia Intensiva, principalmente em uma fase mais tarde da infecção por COVID-19, há o risco de superinfecção por bactérias hospitalares, as quais geralmente são mais resistentes. O sistema imunológico enfraquecido pelo SARS-CoV-2 facilita o desenvolvimento de infecções bacterianas nos indivíduos com COVID-19, o que é agravado pelo uso de dispositivos invasivos, tais como a ventilação mecânica, em que há a formação de um biofilme bacteriano, sendo este um dos principais mecanismos que facilitam o desenvolvimento da pneumonia bacteriana(6). Neste cenário, as principais bactérias relacionadas a pneumonia hospitalar são Pseudomonas aeruginosa, Klebsiella spp. e Staphylococcus aureus(3,6,7,8,9).
Geralmente, não é possível diferenciar a COVID-19 da PAC com base apenas nos sinais e sintomas. Observou-se que os pacientes com pneumonia bacteriana têm maior probabilidade de desenvolver os sintomas rapidamente, apresentar escarro purulento e dor pleurítica(7). A pneumonia secundária geralmente ocorre após a fase inicial da infecção respiratória viral, podendo também ocorrer durante a fase de recuperação, e o agente etiológico pode ser identificado através de culturas bacterianas de lavado broncoalveolar e/ou escovado brônquico em pacientes enfermos com COVID-19(10).
Os achados laboratoriais na infecção pelo SARS-CoV-2 incluem linfopenia (83%), aumento de provas inflamatórias (como, por exemplo, proteína C reativa e ferritina) e anormalidades nos parâmetros relacionados à coagulação (trombocitopenia, alargamento do tempo de protrombina, aumento do d-dímero e redução de fibrinogênio(11). Os achados radiológicos relacionados à pneumonia viral pela COVID-19 incluem infiltrados bilaterais na radiografia de tórax e opacidades bilaterais em vidro-fosco, com predomínio periférico com ou sem consolidações associadas na tomografia computadorizada. No entanto, essas características não são específicas e variam de acordo com o estágio da doença(12-14).
A pneumonia bacteriana sempre deve ser suspeitada quando houver febre persistente, associada a hemograma com neutrofilia, embora esta alteração laboratorial possa estar presente na fase aguda da infecção pelo SAR-CoV-2(15). A procalcitonina é um biomarcador sérico que auxilia na distinção entre infecção bacteriana de outras causas de infecção ou inflamação, sendo um complemento útil para orientar a terapia com antibióticos e auxiliar na incerteza diagnóstica. No entanto, enquanto os valores de procalcitonina são baixos na maioria dos pacientes com COVID-19, os valores podem aumentar nos casos mais graves, independente da coexistência de infecção bacteriana. O mecanismo para tal alteração ainda é incerto(16). Os achados radiológicos cursam com opacificação lobar ou segmentar com ou sem broncogramas aéreos na radiografia de tórax. A tomografia computadorizada mostra consolidação densa focal segmentar ou lobar com ou sem opacidades em vidro fosco(3).
A detecção do agente causal da pneumonia pode ser feita pelo exame das secreções coletadas na via respiratória, e em alguns casos, com próprio tecido pulmonar. A análise do escarro é útil na avaliação inicial, podendo-se realizar diversos exames, dentre eles o exame a fresco para visualização de fungos e após colorações de Gram, e Ziehl-Nielsen para bacilos álcool ácido resistentes (BAAR). De um modo geral, embora a cultura do escarro expectorado tenha baixa especificidade e sensibilidade, salvo quando a amostra seja significativa e de boa qualidade é possível isolar o patógeno causador da infecção(17).
O espécime clínico pode ser coletado através de técnicas invasivas, destacando-se: aspiração transtraqueal, broncoscopia com cateter de coleta protegido, lavado broncoalveolar, biópsia transbrônquica e escovado brônquico protegido. Esse tipo de amostra é o mais indicado para pesquisa de vírus e citologia(17). A hemocultura pode ser realizada em todo indivíduo que necessite de internação por pneumonia, podendo ser coletada, duas séries de três amostras colhidas em diferentes locais, ou a critério médico18.
Em relação aos derrames pleurais, esses devem ser puncionados por toracocentese. É importante que haja um volume em torno 500 mL de líquido na cavidade pleural. No líquido pleural, pode-se determinar o pH, a concentração de proteínas, glicose e desidrogenase lática, além da quantificação dos leucócitos, inclusive com contagem diferencial, análise citológica e microbiológica(19).
As diretrizes brasileiras para PAC recomendam a antibioticoterapia empírica em todos os pacientes com suspeita clínica de infecção bacteriana de alto risco ou com suspeita de sepse considerando que, provavelmente, os patógenos bacterianos nestes pacientes com COVID-19 e pneumonia sejam os mesmos(2,20). É importante reavaliar a escolha dos antimicrobianos, diariamente, com base na avaliação clínica e nos resultados dos exames microbiológicos e complementares(21).
Referências